Tomo anti-inflamtório ou antibiótico?

Bom, antes de mais nada vale lembrar que o antiinflamatório passou a ser anti-inflamatório pela nova regra ortográfica. Mas o acordo ortográfico não mudou a escrita de "antibiótico" nem tampouco a dúvida de muitas pessoas sobre quando e como usar estas duas classes de medicamentos.

O que eu observo nas consultas é que a maioria das pessoas vê estas drogas como tratamentos gradualmente mais agressivos para suas doenças. Isto é: se eu estou com uma faringite leve, por exemplo, que não me incomoda muito, posso começar tomando um anti-inflamatório, mas se a faringite piorou e está doendo muito, é hora de passar para um antibiótico...

Apesar de muitas vezes o médico realmente começar tratando com um anti-inflamatório e depois acabar presecrevendo um antibiótico, o raciocínio de que se tratam de medicações progressivamente mais "pesadas" não está correto.

Um conceito básico, fundamental, que é preciso que fique claro é que antibiótico só trata infecção causada por bactéria. Antibiótico não tem nenhum efeito sobre uma infecção viral. E os resfriados, gripes e a maioria das faringites são infecções virais. Portanto não tem indicação de antibiótico.

Então é simples: não precisa tomar antibiótico para nariz entupido e dor de garganta, pois são viroses... Certo? Infelizmente não é tão simples assim.

Acontece que existe uma coisa chamada infecção bacteriana secundária. Isto é, a baixa da imunidade causada pela virose, a secreção produzida e acumulada no nariz e na garganta, a inflamação da mucosa da garganta e do nariz, tudo isso propicia que as bactérias se aproveitem da virose e também se proliferem, causando assim a tal infecção secundária. Aí sim, vale a pena usar antibiótico... Além disso, existem alguns casos menos frequentes em que a infecção já é bacteriana desde o início, em especial nos pacientes que têm crises recorrentes...

A pergunta natural que surge é: como saber se eu estou com a tal infecção bacteriana (casos em que se deve utilizar antibiótico) e não com uma virose? Bom, existem vários indícios que apontam para uma infecção viral ou bacteriana. Nenhum deles serve isoladamente como parâmetro para definir o tratamento, mas todos eles analisados em conjuto ajudam o médico a tomar a decisão. Então vejamos o que levar em conta.

Para dor de garganta:

- A dor de garganta de origem viral é muito mais comum que a de origem bacteriana (na proporção aproximada de 8:1). De modo que, só pela prevalência, é ponto para não usar antibiótico;

- As infecções virais tendem a ter sintomas que afetam várias partes do corpo ao mesmo tempo, isto é, o nariz está entupido, a garganta doi, dá um pouco de tosse, o corpo também doi um pouco, o ouvido incomoda, etc... Já as infecções bacterianas tendem a concentrar os sintomas (em especial a dor) em uma única região. O paciente diz que está com dor de garganta e pronto. "E o nariz, incomoda?" - "Um pouco doutor, mas o que me incomoda mesmo é a garganta". "E tosse?" - "Nem tanto, é mais a garganta mesmo, doutor.";

- No caso do paciente ter um resfriado que evolui para a tal infecção bacteriana secundária, muitas vezes observa-se que os sintomas que eram difusos pelo corpo agora se concentram na garganta. "Está com tosse, catarro, nariz entupido?" - "Já tive, doutor, na semana passada quando estava resfriado. Agora é mais a garganta mesmo" (esse é um caso provável de infecção bacteriana secundária que merece antibiótico);

- O tempo de evolução também deve ser levado em conta. Infecções virais duram em média 5 a 7 dias para se resolverem. As infecções bacterianas podem durar mais tempo (principalmente se somarmos o tempo de uma infecção bacteriana ao da infecção viral que lhe deu origem;

- A dor muito forte ao engolir, que dificulta de forma significativa a alimentação, fala a favor de infecção bacteriana;

- A queixa unilateral, ou seja, se doi bem mais de um lado da garganta do que de outro, é fortemente sugestivo de infecção bacteriana. As viroses tendem a ser simétricas nas suas manifestações;

- Linfonodos cervicais: O surgimento daqueles carocinhos no pescoço, um pouco dolorosos, quando a garganta está inflamada, é absolutamente esperado. Eles são uma resposta do organismo a qualquer inflamação e costumam desaparecer bem depois que a dor de garganta já foi embora. Mas o surgimento de linfonodos nitidamente assimétricos (mais de um lado que do outro) também sugere infecção bacteriana;

- A presença ou não de febre e o grau da febre não são parâmetros confiáveis para uma diferenciação entre infecção viral ou bacteriana. Ambas podem cursar com febre alta ou mesmo sem febre.

 

Para o resfriado / sinusite:

- Assim como na dor de garganta, a imensa maioria dos casos de nariz entupido são virais (resfriados ou gripes) e não necessitam de antibiótico. Nesse caso a proporção chega a 92%;

- Novamente como na dor de garganta, os sintomas dos resfriados tendem a ser mais difusos pelo corpo (nariz entupido, sensação de cansaço, dores no corpo, um pouco de tosse), ao passo que a dor facial, principalmente ao abaixar a cabeça e caminhar (ao redor do nariz, atrás dos olhos ou nos dentes) é mais sugestiva de uma sinusite bacteriana;

- Também como na dor de garganta, o tempo de evolução é importante. Um resfriado que dura mais que uma semana sem evoluir para melhora deve despertar a suspeita de uma sinusite bacteriana secundária, que se beneficiaria de antibiótico;

- A coloraçao da secreção não é um parâmetro muito confiável. Uma virose pode causar secreção esverdeada nasal. A mudança nítida de uma secreção clara para uma esverdeada após algum tempo de doença, no entanto, deve ser levada em conta;

- Novamente como na dor de garganta, queixas unilaterais (secreção mais de uma narina que da outra, dor mais de um lado do rosto que do outro) são bastante sugestivas de sinusite bacteriana.